Em uma decisão significativa para a proteção dos direitos humanos, o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quinta-feira (31) a retirada da circulação de quatro livros jurídicos que contenham trechos com teor homofóbico e misógino.
Além disso, os dois autores das obras, juntamente com a editora responsável pela publicação, foram condenados a pagar uma indenização de R$ 150 mil por danos morais coletivos. A decisão ainda permite a reedição dos livros, desde que os trechos incompatíveis com a Constituição sejam retirados.
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A medida foi tomada após recurso do Ministério Público Federal (MPF), que questionou o conteúdo discriminatório de cinco livros dos mesmos autores. Segundo o MPF, alunos da Universidade Estadual de Londrina (UEL), no Paraná, identificaram os trechos preconceituosos nas obras disponíveis na biblioteca da instituição. As obras abordam temas como Biodireito, Direito Penal, Direito do Consumidor, Direito do Trabalho e Direito Constitucional, mas, de acordo com o MPF, incluem passagens que promovem preconceitos contra mulheres e população LHGBTQIA+.
Entre os trechos citados, uma das obras alega que propagandas “influenciaram” crianças a se tornarem homossexuais e sugere que essa prática seria uma ameaça à humanidade, associando-a à propagação do HIV e à ausência de procriação. Outros trechos dos livros condenam práticas sexuais entre pessoas do mesmo sexo e descrevem a homossexualidade — referida pejorativamente como “homossexualismo” — como uma “anomalia” que precisa ser combatida. As passagens incluem ainda declarações de manifestações aos bissexuais e a menção a uma suposta “máfia gay”. Em relação às mulheres, os livros contêm afirmações depreciativas, como a ideia de que elas só são “escolhidas” pelos homens para casar se forem “menos afetas à promiscuidade”.
Na decisão, Dino destacou que, embora a Constituição garanta a liberdade de expressão e proíba a censura, o direito à expressão não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais de igualdade e dignidade humana. Dino argumentou que a Constituição impõe “limites explícitos à liberdade de expressão” para impedir discursos que promovam ódio e intolerância. Citando uma decisão do STF de 2003, ele enfatizou que a liberdade de expressão não abrange o incentivo à violência e à discriminação racial.
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O magistrado também publicou estatísticas recentes para embasar sua decisão. De acordo com os dados apresentados, o Brasil registrou 257 mortes violentas de pessoas LGBTQIA+ em 2023, um número alarmante que ressalta a vulnerabilidade dessa população e reforça a necessidade de medidas que coíbam o discurso de ódio. Além disso, o ministro lembrou que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, um compromisso internacional.
O caso chegou ao Supremo depois que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) decidiu, em 2016, pela manutenção dos livros em circulação. Na época, a maioria dos desembargadores entendeu que o conteúdo das obras não apresentava risco suficiente para incitar o ódio. No entanto, a decisão de Dino reflete uma interpretação mais rigorosa sobre os limites da liberdade de expressão em relação às publicações.
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A decisão do STF é um marco no combate à difusão de ideias que reforçam preconceitos e discriminação em obras acadêmicas e jurídicas. Ela destaca a responsabilidade dos autores e editores em garantir que os conteúdos publicados estejam alinhados com os direitos fundamentais e não promovam o discurso de ódio. Ao importar uma indenização por danos morais coletivos, a decisão visa também inibir futuras publicações de teor discriminatório, reforçando o compromisso do Judiciário em proteger o grupo.
Confira decisão DECISÃO STF