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CPI da Americanas foi encerrada sem apontar culpados por rombo de R$ 20 bilhões

Comissão foi acusada de “blindagem” ao trio de controladores da empresa (Carlos Alberto da Veiga Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Hermann Telles).

  • Por AM POST

  • 02/11/2023 às 11:39

  • Atualizado em 02/11/2023 às 11:44

  • Leitura em 7ete minutos

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigava as inconsistências nas contas da empresa Americanas encerrou suas atividades no dia 26 de setembro, com a aprovação do relatório por uma maioria de 18 votos favoráveis contra oito votos negativos. O texto, de autoria do deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), diz que não conseguiu identificar os responsáveis pelas inconsistências de R$ 20 bilhões e se limitou a fazer sugestões de melhorias legislativas.

De acordo com o relatório apresentado pelo deputado Chiodini, não foi possível definir de forma precisa a autoria dos fatos identificados, nem imputar a respectiva responsabilidade criminal, civil ou administrativa a instituições ou pessoas determinadas. Chiodini alega que apontar culpados poderia resultar em possíveis violações de direitos.

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No relatório, o deputado mencionou as investigações em curso da Polícia Federal e do Ministério Público sobre as fraudes nas contas da Americanas. Segundo ele, essas investigações estão mais avançadas e devem apontar os responsáveis pelas irregularidades.

Mecanismo

O esquema de fraude na Americanas revela a sofisticação e a audácia dos criminosos envolvidos. A manipulação dos valores das dívidas com fornecedores e a criação de lucros fictícios demonstram a complexidade do esquema.

O esquema de fraude na Americanas se baseava em duas etapas fundamentais. A primeira envolvia a redução dos valores devidos a fornecedores, através da criação de lucros fictícios no balanço da empresa. Isso era feito por meio da manipulação de um instrumento chamado VPC, que ocorre quando o fornecedor dá descontos comerciais em um produto para o cliente final. A Americanas fraudava cartas de VPC, diminuindo assim suas dívidas com os fornecedores.

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No entanto, reduzir fraudulentamente uma dívida não gera liquidez de caixa. Por isso, entrava em cena o segundo passo do esquema: a operação de risco sacado. Essa operação consiste em uma antecipação de recebíveis feita junto ao banco, permitindo que a empresa receba antes pelos produtos que teria a vender. Dessa forma, a Americanas conseguia aumentar artificialmente o saldo de sua conta bancária, criando a ilusão de lucros.

Segundo especialistas, pelo menos quatro crimes foram cometidos nesse esquema de fraude. O principal deles é a associação criminosa, prevista no artigo 288 do Código Penal. É evidente que a fraude não foi realizada por um único indivíduo, envolvendo a participação de várias pessoas. Além disso, a falsidade ideológica também está presente, uma vez que foram inseridas declarações falsas em documentos para alterar a verdade sobre fatos juridicamente relevantes, o que configura o crime previsto no artigo 299 do Código Penal.

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Outros dois crimes relacionados à fraude na Americanas são a manipulação do mercado e o Insider trading. Segundo a Lei 6385/1976, é considerada manipulação do mercado a realização de operações simuladas ou manobras fraudulentas para alterar o valor de ativos mobiliários, o que pode ser enquadrado no crime previsto no artigo 27-C dessa lei. Já o Insider trading consiste em utilizar informações relevantes ainda não conhecidas do mercado para obter vantagem. Esse crime é previsto no artigo 27-D da mesma lei.

Acionistas de referência e suas ligações com a empresa

O trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira são os acionistas de referência da Americanas. Segundo depoimentos e documentos apresentados durante a CPI, os acionistas tinham participação ativa nos assuntos da companhia, especialmente na área financeira. Essas ligações levantaram suspeitas sobre a responsabilidade dos acionistas na fraude bilionária.

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Parte do colegiado apontou “blindagem” ao trio de controladores da empresa (Carlos Alberto da Veiga Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Hermann Telles).

Apesar de reconhecer a possível participação da cúpula da empresa, o relator, deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), disse não haver provas suficientes para indiciar os responsáveis pelas irregularidades no balanço contábil que mascararam o rombo bilionário.

“Não tem comprovação e não deu tempo para sermos inquisidores, fazer papel de polícia, juiz e promotor”, disse. “Não tenho a coragem de acusar pessoas antes das investigações, a cada dia saem novos fatos”, reiterou o parlamentar.

O deputado João Carlos Bacelar (PL-BA) chamou o texto de “relatório da blindagem”. “Estamos acabando hoje lamentavelmente essa CPI com a blindagem que tirou a condição dos membros da comissão de ouvir essa turma que assaltou o Brasil”, disse.

Críticas

Apesar de ter sido aprovado, o relatório foi alvo de críticas de parlamentares e levou até a união do PL e do PSOL, dois partidos que estão tradicionalmente em lados opostos em debates políticos.

A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) lamentou o desenrolar da CPI e afirmou que houve uma tentativa de blindar acionistas e empresas envolvidas, como os bancos e as empresas de auditoria. Ela destacou que o relatório parecia ter sido encomendado pelos acionistas e pela diretoria da Americanas. Já o deputado João Carlos Bacellar (PL-BA) concordou com as críticas e afirmou que o relatório era uma “blindagem” para os acusados.

“O mercado de capitais sofreu a maior corrupção de sua história promovida por aqueles que não só deveriam estar indiciados no relatório, deveriam estar presos”, concluiu a parlamentar.

O encerramento da CPI aconteceu sem nem ao menos ouvir o ex-CEO, Miguel Gutierrez, que enviou um depoimento por escrito para a comissão, bancos e acionistas. No depoimento, Gutierrez afirmou que os controladores da empresa participavam ativamente do cotidiano da companhia de varejo, com destaque na área financeira, onde foi executada a fraude de R$ 20 bilhões revelada neste ano. O ex-executivo ainda afirmou que tudo que sabia sobre a empresa era informado a Sicupira.

A falta de transparência e a ausência de depoimentos-chave como o de Gutierrez levaram a críticas sobre a imparcialidade da CPI da Americanas. Parlamentares e a opinião pública questionaram a efetividade da comissão em investigar os responsáveis pela fraude milionária. Além disso, a união de partidos que tradicionalmente estão em lados opostos reforçou a desconfiança em relação aos resultados alcançados.

Redação AM POST*

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