Diante das novas regras que proíbem doações de empresas para campanhas eleitorais, os partidos oficialmente recorrem à militância em busca de doações individuais para colocar de pé campanhas de candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador. Mas no mundo político pouca gente acredita que o financiamento eleitoral ficará restrito ao que prevê a lei. Com a proibição de empresas doarem a candidatos e partidos políticos, especialistas apostam – e deputados admitem – que as eleições municipais de 2016 poderão representar a explosão do caixa dois. Alertam também para o risco de que o CPF de eleitores seja usado indevidamente para justificar doações ilegais.
Em 2018, quando a população voltará às urnas para as eleições presidenciais, o cenário de incertezas e volatilidade de caixa deve se repetir. “As eleições deste ano são um grande campo empírico para se discutir financiamento em 2018. A síndrome de reformismo não vai resolver o país”, critica o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB, Erick Wilson Pereira.
PUBLICIDADE
“As pessoas vão sair alugando pessoas físicas para doarem. A campanha vai custar menos? Não. Você vai ter que pagar aluguel de doador”, diz o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Assim que foi confirmada em setembro a decisão do STF de vetar doações empresariais a candidatos, o peemedebista resumiu: “Vai conseguir se eleger aqui quem tem tempos de Operação Lava Jato”, o Ministério Público Eleitoral promete intensificar a fiscalização da engenharia financeira de candidatos e coligações, mas a tarefa não deve ser fácil.
Observadores afirmam que é difícil comprovar de imediato a troca de favores entre um empresário que empresta um helicóptero para gravações de propaganda partidária e o candidato beneficiado. Ou entre um generoso doador individual, que oficialmente repassará dinheiro a uma campanha em que acredita, e as negociações de benefícios que terá no caso de o político ser eleito.
PUBLICIDADE
“O fim das doações privadas, estabelecido por decisão do Supremo Tribunal Federal, é algo que haverá de ter um controle maior da Justiça Eleitoral e também do Ministério Público Eleitoral e da sociedade civil organizada”, diz o presidente do TSE, ministro Dias Toffoli.
Em 2002, por exemplo, o pecuarista José Carlos Bumlai, hoje preso por participar do escândalo do petrolão, emprestou uma fazenda no Mato Grosso para que o então novo amigo Lula pudesse gravar trechos de sua propaganda partidária. Desde então passou a utilizar o nome do petista nas mais diversas negociatas e até topou contrair um empréstimo fictício de cerca de 12 milhões de reais para abastecer os cofres do PT com propina. Na Lava Jato, investigação que descortinou o esquema bilionário de repasse paralelo de propina a campanhas políticas, empreiteiras despejaram dinheiro em partidos e em campanhas dos mais diversos caciques políticos em troca de benefícios em obras da Petrobras.
PUBLICIDADE
“Uma questão que sempre aconteceu muito, principalmente em campanha municipal, são os empréstimos de amigos, parentes ou mesmo fora do sistema financeiro com agiotas. Agora nestas eleições todos os empréstimos só podem ser feitos no sistema financeiro por instituições financeiras autorizadas a operar e regulados pelo Banco Central. No caso de empréstimos como o de helicópteros, a cessão deve estar registrada online para acompanhamento imediato do eleitor”, afirma Toffoli.
Além do impasse sobre as dificuldades de arrecadação de dinheiro para campanhas, pela primeira vez a eleição municipal deste ano vai trazer limites de gastos de campanhas estabelecidos pela Justiça Eleitoral. Nas disputas anteriores, por falta de regulamentação do Congresso, eram os próprios partidos e candidatos que definiram quanto pretendiam gastar no processo eleitoral. Em 2014, a campanha à reeleição de Dilma Rousseff (PT) estabeleceu teto de 383 milhões de reais, sendo míseros 565.000 reais de pessoas físicas. Agora, com base nos valores desembolsados nos últimos anos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fixou o teto máximo das despesas dos candidatos a prefeitos e vereadores.
PUBLICIDADE
Nas eleições que terão o mais número de partidos em busca do voto do eleitor – 35 no total – cada agremiação ainda terá o desafio de trabalhar com o menor período de campanha da história, apenas 45 dias, começando em 16 de agosto, e com menos tempo, 35 dias, para a propaganda dos candidatos no rádio e na TV. Sem dinheiro e com menos exposição para se apresentar ao eleitor, analistas projetam que na disputa serão favorecidos políticos já conhecidos do grande público, que normalmente estão em busca da reeleição, e personalidades puxadoras de voto, como esportistas ou artistas de TV.
“A redução da campanha só beneficia quem tem mandato ou aquele candidato que é apresentador de televisão. No formato atual, não há recursos nem tempo para o candidato poder construir seu nome ou a sua proposta. Não vão surgir novas lideranças, que é o que o Brasil precisa hoje”, diz Erick Pereira.